Não imaginava que eu teria um segundo filho, não imaginava que eu teria
um dia um parto normal, não imaginava que esse parto seria tão intenso e
nem muito menos que a história teria tanta repercussão. Muito se
comenta, muito se conta, muito se fala. Muitos comentários sem sentido,
sem saber do que de fato aconteceu. Mas a minha história só eu sei.....e
é essa:
Eu não planejava ter um segundo filho. Tomava
anticoncepcional, mas quando a cartela do mês acabou e a menstruação não
veio suspeitei imediatamente da gravidez. Descobri que estava grávida
pela segunda vez no dia 18/08/2011, eu estava com apenas 3 semanas de
gestação. No início foi difícil aceitar que agora eu seria mãe de dois,
pois eu larguei o emprego para cuidar do meu primeiro filho, que nessa
época já tinha 3 anos e eu estava me reorganizando para retomar a vida
profissional. E de repente, tudo mudou!
Com aproximadamente 15
semanas, já feliz com
a gestação e fazendo planos para a chegada do bebê eu fui convidada
pela minha irmã Luciana para ir a um grupo de gestantes, o Ishtar. Assim
como a grande maioria das mulheres eu não tinha informação alguma sobre
parto normal e natural e acreditava que cesárea era algo comum e
perfeitamente aceitável. Meu primeiro filho nasceu através de uma
cesareana eletiva, com 36 semanas de gestação, no dia 28/12/2007 (o
motivo hoje eu sei: conveniência médica).
Bastou apenas um encontro
para que o meu conceito mudasse. Cheguei caladinha, de mansinho, ouvindo
e observando as conversas das meninas e os relatos das mães que tiveram
e que desejavam ter um parto. Eu decidi: também quero isso para mim!!
Ao final do encontro já comecei a buscar contatos de doulas e de
médicos. Só havia um médico que atendia ao meu plano de saúde, mas era
em outra cidade. Eu não tinha condições de pagar por um pré-natal e
parto particular, pois em casa somente
meu marido trabalhava. No início foi muito difícil convencer o meu
marido de que seria necessário ir para Niterói para ter um parto. Tendo
um plano de saúde considerado bom ele não compreendia porque eu não
podia escolher um médico que atendesse o convenio na própria cidade.
Depois de muitas conversas (e de passar por algumas consultas com
médicos do convenio no Rio de Janeiro) ele finalmente entendeu que se eu
realmente quisesse ter um parto normal eu precisaria de um médico
topasse acompanhar. Afinal, eu já tinha uma cesárea anterior e a
justificativa dos médicos era sempre a mesma: uma vez cesárea, sempre
cesárea. Decidimos então marcar a consulta com o médico de Niterói.
Segundo relatos ele tinha histórico de ter acompanhado alguns partos
após cesárea então se ele topasse fazer meu pré-natal eu tinha chances
maiores do que com qualquer outro médico de convênio. Durante todas as
consultas de pré-natal ele não demonstrou
nenhuma objeção ao parto. Sempre muito educado, respondia meus
questionamentos e aceitava todas as condições propostas por mim.
Assim,
tranquilamente, se passaram 38 semanas. Na última consulta, ele
comentou durante os exames que o bebê ainda estava alto, por isso
acreditava que o bebê nasceria somente próximo da minha DPP, que era dia
21/04/2012. O bebê estava bem e eu também. Porém, ele solicitou que eu
fizesse uma utrassonografia com 39 semanas, alegando que “você tem como
saber se está se sentindo bem, mas nós não temos como saber se o bebê
está realmente bem aí dentro”. Essas palavras me deixaram um pouco
confusa, já que passei a gestação inteira estudando bastante e sabia que
em gestação de baixo risco, nenhuma ultrassom era necessária após as 24
semanas. Além disso, ele me liberou da consulta da semana seguinte (39
semanas) justamente porque o bebê estava bem clinicamente e eu também.
Então pensei: afinal, tem
ou não tem como saber se o bebê está bem? Se houvesse alguma suspeita
de problema eu deveria voltar na semana seguinte, não? Qual teria sido o
motivo da ultrassom? Decidi marcar a ultrassom para o dia 24/04/2012,
data em que eu já estaria com 40 semanas completas e sabia que a partir
daí era realmente necessário um acompanhamento mais cuidadoso.
No dia
17/04/2012 por volta das 19hl da noite, comecei a ter pródromos. Eu já
havia tido algumas noites anteriores de pródromos então acreditei que
seria só mais uma noite como aquelas e que o trabalho de parto ainda não
iria engrenar. Comi, tomei banho e fui dormir.
Por volta das 2hs da
manhã eu já estava muito incomodada, ficar deitada era impossível.
Levantei e fui ao banheiro, percebi na calcinha um pequeno sangramento e
fiquei eufórica: AGORA VAI!!! Continuei sozinha, tentando relaxar e
segurar a ansiedade, mas por volta das 4hs da manhã eu já sentia que
precisava de companhia.
Liguei para a minha irmã que também era minha doula, que veio
imediatamente para a minha casa. Eu estava muito agitada e queria
caminhar. Saímos então para caminhar ao ar livre no condomínio. A cena
era até engraçada... duas “loucas” caminhando sem rumo em plena
madrugada. Durante a gestação eu havia decidido contratar uma “segunda
doula”, pois a minha irmã poderia ficar muito envolvida emocionalmente
(por ser o nascimento do sobrinho). Por volta de 7hs da manhã, decidi
então ligar a para a doula Ana. Enquanto aguardava a chegada dela a
minha irmã foi comprar pão para tomarmos café, afinal eu precisava me
alimentar, ainda havia muito trabalho a ser feito! A Ana chegou por
volta das 8hs e tomamos café todas juntas, entre as contrações, que
nessa altura ainda vinham bastante espaçadas (cerca de 15 minutos de
intervalo).
Meu marido foi trabalhar normalmente. E assim ficamos
durante todo o dia, almoçamos, caminhamos mais.
Relaxei, ouvi musicas (eu havia gravado um CD para o momento da chegada
do meu bebê)... Chorei ao ouvir a musica de Chico Cesár – Quando eu
fecho os olhos. Eu não podia acreditar que tudo estava dando certo e que
em breve eu conheceria o rostinho do meu bebê.
O tampão saiu por volta das 15hs.
Meu
marido chegou em casa por volta das 16hs e começamos a discutir a ida
para o hospital, já que morávamos longe e pegaríamos muito transito na
ponte Rio-Niterói (a hora de rush estava próxima). Tomamos banho e nos
preparamos. Decidimos sair de casa às 17:30 hs. As contrações vinham em
intervalos menores, mas eu ainda estava bem. Eu sabia que ainda não
estava em estado avançado de trabalho de parto, mas me senti mais segura
e confortável indo para o hospital naquele momento. O principal motivo
dessa decisão foi o fato de que ficar horas praticamente imóvel dentro
de um carro e parada no transito me parecia algo terrível para uma
mulher
em trabalho de parto, quanto antes eu fizesse isso melhor seria para
mim! Chegamos ao hospital pouco mais de 19hs. O médico ainda não havia
chegado. Esperamos na recepção e ele logo chegou. Fomos para uma salinha
onde eu seria examinada. Após um exame rápido ele me falou “eu não
queria te desanimar, mas você está somente com 1 dedinho de dilatação e o
bebê ainda está no plano 0 da pelve.” Eu não acreditei que após um dia
inteiro de contrações eu só havia evoluído 1 cm. Fiquei muito frustrada
naquele momento, mas respirei fundo e segui em frente. Eu queria muito
aquele parto. Os batimentos do bebê estavam OK e isso me deixou
tranqüila para continuar. Comentamos sobre a hipótese de voltar para a
casa. O médico disse que de fato recomendaria isso se eu morasse na
mesma cidade, mas como morávamos no Rio de Janeiro talvez fosse mais
confortável ficarmos hospedados no hospital enquanto aguardávamos a
evolução do trabalho de
parto. Eu concordei prontamente, pois não desejava passar horas carro
novamente, foi muito incômodo (eu tinha dado graças a Deus por ter
chegado...rsrs).
Meu marido foi junto com o médico dar entrada na
internação. Havíamos feito um acordo de que o parto seria feito no
próprio quarto do hospital, mas não sabíamos se de fato o médico
conseguiria essa liberação. Fiquei ainda na recepção com a Ana e a minha
irmã, aguardando. O desconforto aumentava cada vez mais e meu marido
demorou muito para voltar. Tudo que eu queria era ir para o quarto, o
chuveiro, o conforto. Pedi então que a minha irmã fosse atrás dele, para
saber o motivo da demora. Quando ela voltou eu percebi que ela estava
com uma cara um pouco estranha. Pensei que havia tido algum problema com
a liberação de fazer o parto no quarto e falei logo “ me fala o que
aconteceu, não me esconda nada”. De inicio ela relutou a me contar, pois
não queria me chatear, eu insisti
que não queria ficar ali fazendo papel de boba e ela então me contou:
“mana, o médico conversou com o Marcelo, por isso a demora. Ele disse
que se essa dilatação não evoluir em 2 horas vai ser feita uma
cesareana. Por isso o Marcelo nem soube me informar nada a respeito do
parto no quarto, ele na verdade já está pensando em como vai te
tranqüilizar a respeito da cesárea. Ele ta um pouco assustado”. Fiquei
um pouco confusa com isso tudo, pois o médico desde o inicio me pareceu
tão confiável. Eu falei pra minha irmã “me ajuda, eu não quero essa
cesárea”. Mal terminei de falar e vi no final do corredor o meu marido,
ao lado do médico, me chamando para irmos para o quarto. Já que eu
estava ali, o jeito era torcer e seguir em frente. Subimos e eu fui logo
tirar a minha roupa e me dirigi ao banheiro, fui para o chuveiro e
fiquei lá tentando me acalmar. Algum tempo depois minha irmã entrou no
banheiro e me perguntou “ mana, você
já sabe qual é a situação. Temos 2 horas para tomar uma decisão. Você
quer ficar no hospital ou quer ir embora?Quer aguardar ele voltar e
esperar um novo exame para saber se evoluiu?” eu respondi “eu não quero
ir de novo para aquele carro”. Ela continuou calmamente me falando “tudo
bem, mas se o médico voltar e estiver tudo do mesmo jeito ele irá te
operar. Você quer tentar uma segunda desopção ou você prefere fazer a
cesárea?” Fiquei irritada por ela cogitar essa possibilidade de cesárea e
respondi até com um tom um pouco alto “claro que não, eu não quero
cesárea, ele não vai fazer cesárea, ele vai ter que esperar, eu vou
mandar ele esperar. 2 horas não é nada!”
O tempo passou... mas as
contrações ao invés de ficarem mais fortes foram ficando mais espaçadas e
fracas. Cheguei a ficar 30 minutos sem ter uma contração!!Entrei em
desespero, a cesárea era certa se eu continuasse ali. Estava se
aproximando
a hora do médico voltar e eu já estava cogitando a possibilidade de
pedir para que ele me liberasse para ir para casa. Por outro lado, eu
estava me sentindo muito insegura e desamparada pelo médico e se eu
fosse embora para o Rio de Janeiro novamente eu definitivamente não
queria voltar para Niterói de encontro com uma possível cesárea. Eu
estava assustada, insegura. Minha irmã repetia a todo momento “você não
está desamparada, estamos todos contigo!”. Isso me confortava, mas não
me acalmava. Pedi que a minha irmã ligasse para uma amiga nossa muito
querida e engajada na causa do parto e nascimento, para saber se a essa
altura do campeonato ainda havia alguma outra possibilidade de médico
caso eu resolvesse ir embora. Aí começou uma movimentação de
telefonemas, entra e saí do quarto. Meu marido, minha irmã (e doula
querida!) e a minha doula..correndo contra o relógio para tentarmos
tomar uma decisão que me deixasse mais segura.
Infelizmente, enquanto eu continuasse ali naquele hospital eu estava já
assistida por um médico e sob hipótese alguma outro médico poderia
pegar o meu caso. Dividida entre continuar ali e brigar com o médico
para que ele me desse mais um tempo ou largar tudo sem rumo e sem
assistência e o pior..entrar de novo naquele carro!Muitas coisas
passavam pela minha cabeça, Falei com a minha amiga ao telefone, que
repetiu tudo aquilo que a minha irmã já havia me falado (em outras
palavras). Enquanto eu continuasse ali ela não tinha como me ajudar, a
decisão era minha. Eram essas as minhas duas opções. Sair de lá e
tentar, ficar lá e aceitar. Mas eu ainda não conseguia acreditar que o
médico em que eu tanto confiei não levaria até o final essa história.
Foi quando ouvi a voz dele no corredor. Eu ainda tinha esperança de
convencê-lo, pedi para que a minha irmã fosse conversar com ele para
sentir em que ritmo ele estava. Ela voltou desanimada,
ele vinha logo atrás dela. Não deu tempo de que ela me contasse a
conversa que teve com ele (só fiquei sabendo depois do nascimento do
Pedro)..ela apenas me falou “ele ta vindo, vai te examinar e vai te
falar da cesárea!”. Agora era a hora, não tinha mais volta. Respirei
fundo!
Deitei e fui examinada de novo. Disse que eu permanecia com
apenas 1 cm e que queria avaliar o batimento do bebê durante uma
contração..mas a contração não vinha!!!Enquanto isso, fora do quarto,
meu marido ainda estava se acalmando e conversando com a nossa amiga
Ingrid a respeito da nossa saída do hospital, quais eram as nossas
possibilidades? Tínhamos 3: hospital publico, plantonista de convenio,
medico particular. Naquele momento eu só pensava em uma coisa: quero
parir. O médico chegou a brincar dizendo que a contração não vinha
porque ele tava lá, o bebê devia estar com vergonha ou com medo dele (e
acho que ele estava mesmo certo, viu!!rs). Ele saiu
do quarto alguns segundos, voltou, ficou bastante tempo no quarto,
conversamos sobre novelas, etc....e nada da contração. Fora das
contrações os batimentos estavam OK, mas a dilatação não tinha evoluído
como ele desejava. Meu marido voltou para o quarto, minha irmã e minha
doula também estavam comigo. Ficamos todos em silêncio e então eu falei
“Dr, eu quero voltar para casa, ficar em casa e esperar a dilatação
evoluir e ai eu decido o que fazer. Se for preciso vir de novo para
Niterói eu venho!!”. A resposta que eu queria ouvir (sim, pode ir) não
veio (como eu imaginava que não viria). Ao contrário, ele começou a
falar e falar e falar... coisas cada vez mais assustadoras. Eu queria
sumir!!
- Infelizmente eu não posso te deixar ir. Eu até havia
comentado com o seu marido ali embaixo. Não quis te falar para não te
deixar preocupada, mas quando te examinei pela primeira vez eu vi um
sinal que me deixou muito preocupado. Há
uma reenrtança no seu útero que indica um risco elevado de ruptura
uterina. Esse sinal é conhecido como Anel de Bandl. É o primeiro sinal
que a gente detecta de que provavelmente o útero vai romper.
Enquanto
ele falava isso meu coração disparava, meu bebê mexia sem parar, eu
rezava e pedia que Deus me ajudasse a tomar a decisão certa. Eu tava ali
deitada, me sentindo impotente.
Eu olhava nos olhos dele enquanto
ele falava aquelas palavras...e Deus...eu não conseguia ver sinceridade.
Aquela sinceridade e segurança que me passou durante todo o pré-natal,
EU NÃO VIA, EU NÃO SENTIA! Para onde foi aquele medico que
conheci?Porque ele estava me aterrorizando? Porque ele não me deixava
ir?porque ele queria me operar? Aquilo só podia ser um pesadelo!!
Minha
irmã estava aflita, junto comigo (temos uma conexão muito forte uma com
a outra). Ela comentou com ele que a minha cicatriz tinha mesmo aquela “
reentrança” desde sempre. Mas
ele respondeu:
- Ah, mas agora ta tudo perfeito, só aparece quando contrai!
Perguntei para a minha irmã:
- Lu, você ta vendo alguma coisa?não mente para mim, me fala!
Finalmente
veio uma contração, ele não auscultou o bebê mas avaliou a cicatriz. Em
meio a dor eu pedi para a minha irmã “olha Lu, ve se ta tudo bem”.
Tudo que ela queria era me manter calma, segurando na minha mão ela
respondeu com um sorriso “ta tudo otimo na sua cicatriz e na sua barriga
e com seu bebe, vai dar tudo certo, relaxa.” O médico respondeu “realmente agora está melhor, quando olhei na primeira vez o sinal estava
muito mais evidente".
Eu havia lido durante a gestação sobre os
sinais de ruptura. Sabia que a chance era muito baixa mas de qualquer
forma eu estudei sobre os sinais: dores que não passam mesmo entre as
contrações, anel de bandl. Nesses casos a cirurgia deveria ser
emergencial, pois mãe e bebe poderiam morrer. Eu estava
super bem, tava feliz, o bebe tava ótimo e o medico apesar de todo o
terror parecia super tranqüilo. Ué, será que eu esqueci de estudar
alguma coisa?será que existia algum outro sinal mais primitivo que
somente ele poderia ter observado? Será que havia um “sinal de um sinal”
???
Perguntei para ele mais uma vez:
- Então, se está tudo bem e eu não evolui, posso ir embora???
Mas não teve jeito. Ele continuou:
-
Olha, eu não posso te deixar ir. Eu realmente fiquei preocupado, eu sou
uma pessoa muito difícil de se preocupar e que tem um limite que demora
a chegar e você sabe bem disso!Mas dessa vez eu realmente estou
preocupado e por mim você não vai sair daqui. Eu não sei se estou
traumatizado porque duas semanas atrás tivemos um caso de ruptura e eu
não quero passar por isso de novo. Eu vi o sinal igual ao seu e fizemos
uma cesárea...quando abrimos tinha realmente ruptura!
Era a hora de
tomar uma decisão. Realizar o meu
sonho ou fazer a cesárea?Todos os meus medos vieram a tona. Eu não
queria de forma alguma colocar a minha vida e a vida do meu filho em
risco. Esse foi o momento de maior desespero que passei em todo o meu
trabalho de parto, para não dizer em toda a minha vida. Entrei em
pânico, chorei desesperadamente como um bebezinho. O medico em pé na
minha frente aguardando uma decisão. Eu sentada na cama, meu marido e
minha irmã ao meu lado me fazendo carinho. Apesar da convicção de que eu
e meu bebê estávamos bem eu pensava “mas e se daqui a pouco não
estivermos?e se ele estiver certo?” no fundo eu sentia que as palavras
dele não eram verdadeiras, eu via no olhar dele. Mas ELE É MEDICO, se eu
não podia confiar nele, em quem confiar?Chorei por vários minutos,
encostei ainda chorando no ombro do meu marido e desabafei:
- Eu não consigo decidir!!!
Então
aconteceu a maior reviravolta. Foi o momento de maior participação do
meu marido. Ele
tomou para si o meu parto, ele bancou o meu parto e a minha decisão.
Ele fez a coisa acontecer. Em meio ao meu choro e minha indecisão meu
marido se levantou e falou em voz alta:
- Então é isso aí Dr. Vamos embora.
Deu um tapinha no meu ombro e continuou:
- Bora mulher, pára de chorar. Não é isso que você quer?? Então pega suas coisas e vamos embora! Levanta!
Eu
ainda não conseguia acreditar que meu marido estava abraçando aquilo
junto comigo. Minha confiança voltou, eu era eu mesma novamente. Eu era a
Juliana Fernandes Monteiro Duarte que queria E IA parir!!
Meu marido justificou para o médico:
- Dr. É o seguinte, nós vamos embora porque ela quer um parto normal entende??
O médico respondeu:
-
Eu entendo. Eu sei o quanto ela quer isso, eu torci muito por ela. Mas
infelizmente eu não posso ignorar um sinal que eu estou vendo. Se você
quiser pode levantar agora, pegar suas coisas e ir embora. Mas EU não
vou te dar
alta.
- Eu entendo. (meu marido e minha irmã responderam juntos)
Meu marido continuou:
- Mas é isso aí, conforme for se precisar, se acontecer alguma coisa pelo caminho...a gente volta. Beleza?
- Vocês vão mesmo embora?
- Vamos!
- Então preciso que você assine um termo de responsabilidade.
Com minha confiança retomada respondi sem medo:
- EU ASSINO!Precisa que meu marido assine também??
- Não.
Pegamos as malas, e quando já estávamos com tudo decidido e saindo do quarto ele voltou e com um sorriso leve no rosto comentou
- Olha só como a vida é engraçada. Às vezes prega umas peças na gente só para tornar tudo ainda mais difícil.
Não era possível, o que mais poderia acontecer??Perguntei:
- O que foi??
-
Acabei de verificar com a recepcionista. Esse é o ultimo quarto do
hospital. Se vocês saírem agora e por acaso acontecer alguma emergência e
precisarem retornar não sei se vou conseguir
interná-la novamente, pois pode não ter mais nenhuma vaga.
Para mim não fazia a menor diferença. Então eu disse: Ok, tudo bem!
Seguimos
até a recepção. Assinei o termo. Era um termo comum de
responsabilidade. Dizendo que eu tinha chegado com contrações regulares
mas não estava mais em trabalho de parto e tinha solicitado a alta, bla
bla bla (não me lembro exatamente o que mais, eu nem olhei direito, eu
so queria ir embora!). Lembro-me bem de um detalhe, nesse termo não
havia nenhuma menção ao tal risco de ruptura uterina que ele havia
observado. O que me tranqüilizou, pois se fosse algo realmente sério ele
teria escrito.
Fomos até o elevador. Apesar de tudo o medico foi
muito educado, nos levou até o elevador, se despediu e me desejou sorte.
Disse que ficaria torcendo por mim.
Descemos e seguimos até o carro.
No caminho eu comentei com a minha irmã que queria que alguém (outro
profissional) avaliasse a minha
cicatriz.
A minha doula Ana ligou então para a nossa amiga e contou
que estávamos indo embora e eu desejava ser reavaliada por alguém que
não fosse ele. Seguimos em direção ao Rio de Janeiro e a Ingrid (nossa
amiga querida, anjo, linda!) telefonou para o celular da minha irmã
dizendo que poderíamos passar na casa da Maíra, uma outra amiga linda e
querida que é enfermeira obstétrica, para conversamos um pouco, acalmar,
tomar uma água..e ela daria uma avaliada na minha cicatriz para me
tranqüilizar e poderia auscultar o bebê também. Algum tempo depois ela
ligou novamente falando que tinha conseguido um médico que estava
disponível para atender o parto em um hospital qualquer do convenio, mas
o parto seria particular. Fiquei preocupada com o dinheiro
inicialmente, mas tudo que eu queria naquele momento era parir, parir,
parir, parir. Daríamos um jeito depois! Seguimos até a casa da Maíra, a
Ingrid foi até lá me ver e me dar um
abraço pessoalmente. Eu estava feliz, entre amigos, segura, abraçada e
agora com muito mais certeza de que tudo terminaria bem.
Meu marido
pegou com o contato do médico e telefonou para ele, para ver como
poderíamos fazer, qual hospital iríamos, qual valor ele cobraria, quais
as formas de pagamento. A Maíra me avaliou entre as contrações e também
durante uma delas e me tranqüilizou em relação ao bebê. Falou que eu
poderia ficar tranqüila que tudo estava aparentemente bem com o meu
útero também. Respirei aliviada, meu filho ia nascer..,meu parto ia
acontecer!Me senti livre e segura para me focar no parto novamente...e
foi incrível como as contrações voltaram com força total naquele
momento. Comecei a ficar irritada na casa da Maíra (tadinha, tão boa
anfitriã rsrsrs) eu queria ir embora, queria a minha casa, meu chuveiro.
Como sabíamos que eu ainda estava na fase inicial de TP, viemos para
casa. E aí a coisa pegou fooooooooogo. No
carro eu já estava com dores muito fortes, comecei a ficar fora de mim.
Eu queria ver a minha mãe, dar um abraço nela e ouvir ela dizer que
tudo iria dar certo..minha mãezinha guerreira que teve 3 partos normais.
Chegando em casa a minha mãe já me aguardava em frente a porta, me deu
um abraço forte!! As contrações já vinham praticamente a cada 3 minutos.
Corri direto para o chuveiro, vi na minha calcinha um pouco de
sangramento. A Ana me explicou que aquilo era provavelmente pela
dilatação do colo.
Fui para o chuveiro loucamente, eu nunca desejei
tanto o meu banheiro e o meu chuveiro rsrsrs. Naquele momento, dentro do
banho, senti que eu realmente agora estava em TP, parto ativo!!Agora
definitivamente a coisa iria andar. Respira, rebola, relaxa,
contração...contração..contração. Já estavam quase sem intervalo. Eu
senti durante todo o trabalho de parto (desde o inicio) uma dor forte na
região lombar (depois descobri que era por
causa da posição do bebê, que tava posterior) por isso passei o dia
inteiro em pé, sentar me incomodava. Naquela hora dentro do chuveiro
essa tal dor ficou INSUPORTÁVEL. Eu precisava de massagem nas costas e
precisava JÁ. Falei para a minha irmã tirar a roupa e entrar comigo no
chuveiro (Box minúsculo do nosso apartamento) e me ajudar. Ela atendeu
prontamente (rsrsrs). Pensei e falei tanta coisa que eu não me lembro
mais...reclamei de tudo e todos, eu só queria a minha irmã. Comecei a
sentir um calor muito grande e resolvi sair do banheiro. Minha mãe nos
aguardava com um mingauzinho carinhosamente preparado. De inicio eu não
quis comer, mas ela me deu colherada por colherada na boca, eu já estava
muitas horas sem comer (desde que fomos para o hospital eu n tinha
comido nada). Depois que sai do chuveiro comecei a sentir uma vontade
muito forte de empurrar. Pensei “não é possível, já???” Como eu queria a
minha irmã ao meu lado todo
momento, a parte mais “burocrática” ficou por conta da outra doula,
Ana. Que ligou para o medico avisando que eu já estava com vontade de
empurrar. Meu marido nessa hora estava dormindo. Foi decidido que
iríamos para o hospital pan-americano, na tijuca...bairro relativamente
próximo de casa.
Minha irmã acordou meu marido. Me vesti e fomos de
novo para o carro (de novoooooo!!). Foi mais um péssimo momento do meu
trabalho de parto. Seguir naquele carro apertado, sem movimentação e com
contrações quase sem intervalos..foi terrível!o hospital tão próximo me
pareceu muito longe. Eu olhava pela janela do carro e não conseguia
identificar onde eu estava, será que faltava muito para chegar?eu estava
fora de mim...acho que estava quase em outra dimensão. Eu só pensava “
hospital, hospital, hospital”. Chegando no hospital o “novo médico”
estava nos esperando. Um anjo chamado Marcos Nakamura, que aceitou me
atender no meio da
madrugada (devia ser por volta de 1h da manhã quando nos encontramos).
Ele estava tranqüilo e me passou muita paz e segurança. Agora sim eu
sentia que podia ir em frente. Entramos no hospital e ele solicitou uma
sala para me examinar. Minha irmã conta que foi muita bucocracia mas eu
não me lembro de naaada, so sei que ele me examinou e ouvi a grande
noticia, a melhor que poderia ouvir 7 CM!!!!!!!!!
Uau, e não é que tudo que eu precisava mesmo era estar com uma equipe que me passasse segurança? Tudo evoluiu muito rápido.
Fomos
dar entrada na internação. Foi quando tivemos mais uma péssima noticia:
não havia vagas. A recepcionista antipática disse que o medico deveria
ter solicitado com antecedência. Como solicitar um quarto com
antecedência para um parto que pode acontecer a qualquer momento?
Irritadíssima com o meu plano de saúde, com o sistema de saúde do
Brasil, com a máfia dos médicos e hospitais pela cesárea, irritada com
tudo. Eu senti na pele tudo que uma mulher não merece sentir, passei
tudo que dizem nos jornais que as mulheres passam. Eu sabia que era
real, que isso acontecia todos os dias, mas não imaginei que aconteceria
comigo. Estávamos sem rumo. Meu marido começou a entrar em contato com
todos os hospitais do plano de saúde. Ele telefonava para alguns e a
minha irmã para outros. Só tapa na cara. Ninguém tinha vaga!!O que
fazer?? Eu bati o pé e me recusei a sair de lá sem rumo novamente, eu
queria ir para um hospital certo, eu queria ir para um lugar onde fosse
ficar até meu filho nascer. Me bateu um certo desespero de que a
qualquer momento ele poderia nascer e nós ainda não tínhamos nada
concreto. Eu senti que estava chegando ao meu limite, eu estava
desgastada emocionalmente e também cansada fisicamente. Minha irmã
decidiu ligar para a minha mãe e contar a situação. Minha mãe disse que
poderíamos seguir para qualquer hospital da cidade
que tivesse vaga, que daríamos um jeito para pagar o hospital mesmo que
fosse particular, ela faria um empréstimo no banco. Era a nossa única
opção. As outras eram ir para o SUS ou ir para o plantonista de algum
hospital, opções inviáveis para mim naquele momento. Eu queria estar
SEGURA.
Pela ultima vez entrei dentro do carro, dessa vez com rumo certo: perinatal de laranjeiras.
Lembro-me
vagamente que xinguei todo mundo, culpei a minha irmã por ter me
convencido a ter um parto normal (tadinha!), culpei o médico dizendo que
eu não gostava dele (pobre Dr, foi um anjo comigo), culpei a minha
outra doula dizendo que ela não estava ajudando em nada (que injusta
eu!) e pior de tudo...culpei meu marido por ter aceitado sair de
Niterói, falei que ele era um irresponsável que ele gostava de me ver
sofrer que eu queria voltar JÁ para Niterói, que eu queria uma cesárea
imediatamente (kkkkkkkk), eu tava em outro planeta, sem noção. Eu
gritei VOCES TODOS SÃO CULPADOS DISSO, VOCES TODOS!.
Chegamos ao
hospital pouco mais de 3 horas da manhã e aí foi só alegria.
Subimos
para a suíte de parto e pedi para ir para o chuveiro. Não tinha chuveiro
naquela porcariiiaaaa...então o jeito era encher a banheira que tinha
lá. Mas a água era gelada e eu detestei. Alem disso eu não conseguia
ficar sentada, pois ainda sentia muita dor na lombar. Nada mais
funcionava. Eu não conseguia sentar, tava cansada e estressada ao
extremo, não tinha chuveiro, não via mais outra opção. Eu precisava
relaxar. Solicitei analgesia. Depois da analgesia eu consegui deitar e
relaxar por algum tempo, não sei quanto tempo...deve ter sido uns 40
minutos. O médico comentou que o bebê ainda estava muito alto e que eu
precisaria trabalhar para faze-lo descer. Ele falou que aguardaríamos
até as 6h e então tentaríamos algumas técnicas para ajuda-lo a descer.
Mas eu não agüentei ficar parada tanto
tempo. Quando me senti recuperada resolvi levantar, caminhar, caminhar,
ficar de cócoras. O médico voltou e ficou animado com a minha
disposição. Examinou e viu que o bebê estava bem, batimentos bem, mas
ainda alto. Ele me olhou e disse “ta tudo perfeito, agora só depende de
você” . Então a cada contração eu ficava de cócoras e fazia força,
força, força. Isso foi durante quase 1h. Eu não sei bem sobre o tempo,
para mim o tempo tinha parado, eu tava parada ali naquele momento. Bom, o
medico veio auscultar novamente e tivemos a ótima noticia de que ele já
tinha descido um pouco mais!!Me animei e fazia ainda mais força quando
vinha a contração. A analgesia já tava perdendo efeito e eu sentia tudo
muito mais intenso. Força, força, força. A bolsa estourou (será?). Eu
pensei que eu tinha feito xixi rs. Algum tempo depois novo exame, bebê
ok, o médico decidiu fazer o toque. Aí de fato a bolsa estourou..ploft!
molhou o medico
todo..que vergonha kkkkkkk!!
Nessa altura do campeonato eu estava
muito cansada e comecei a achar que não conseguiria levar isso até o
fim. Me senti um pouco tonta como se fosse desmaiar. Vomitei
bastante...e comecei a ter uma espécie de fobia do quarto onde
estávamos. Eu precisava sair do quarto, ver Sol, ver luz, ter
liberdade!!Já eram por volta de 7 ou 8 horas da manhã. Comecei a falar
que eu não queria mais, que eu ia desistir, que eu não era capaz. A
minha irmã saiu do quarto e foi conversar com o médico. Voltou junto com
ele e com a Ana Fialho, médica assistente... outro anjo de Deus em
minha vida que deu um gás novo ao trabalho de parto, sangue novo,
energia nova. Ela pediu para me examinar novamente e eu permiti. Me
falou que eu estava quase com dilatação completa e o bebê não estava
mais posterior, ele já tinha virado e estava pronto para nascer. Nesse
momento eu pensei “ótimo, falta pouco, eu consigo sim!ufa!”.
Esses
momentos finais ficaram um pouco confusos na minha cabeça, não me
lembro de absolutamente nada que foi falado, nada do que aconteceu, tudo
que eu pensava era eu, bebê, força, nascer. Vamos, vamos, vamos!Meu
marido (que estava dormindo na sala ao lado) foi chamado para acompanhar
o nascimento. Lembro de alguns momentos onde eu achava que não ia
conseguir mais fazer força, que eu já tinha feito toda a força possível,
mas o Dr Marcos, a Dra Ana e a minha irmã Luciana me davam força e
coragem dizendo que eu era sim capaz e que meu filho já estava quase
nascendo. Senti muita vontade de fazer cocô, muito calor e muita sede. A
Dra Ana me explicou que tudo aquilo era sinal de que estava muito
próximo de ter meu filho nos braços. Que alegria, nova injeção de animo e
coragem...força, força, força. Tentei muuuitas posições: de joelhos, de
quatro, de cócoras, deitada de lado. A única que me senti confortável
foi semi-sentada em cima da
cama. Mais ou menos de 1 hora de expulsivo, enfim tive o Pedro em meus
braços e o sentimento que eu tive foi: CONSEGUI! Vitória, superação,
garra, conquista...nem sei direito tudo que passou, todos os sentimentos
maravilhosos. Olhei para o meu marido e falei “amor, eu consegui” olhei
para a minha irmã e disse “ Lu, você viu isso?eu consegui” abracei
forte o meu filho e falei “filho, NÓS CONSEGUIMOS!eu não sei como, mas
nós conseguimos!!”. Eu estava realizada. Completa. Nunca imaginei que
tudo isso aconteceria, mas não me arrependo de nada nem por um segundo.
Toda a equipe me parabenizou. Mesmo com todas as dificuldades foi um
parto incrível e inesquecível. Não me arrependo de ter saído de Niterói,
de ter me recusado a ser operada novamente, de ter corrido atrás do meu
sonho. Eu faria tudo outra vez!!!
Meu filho ficou comigo o tempo
todo, foi amamentado logo ao nascer, não foi aspirado, não recebeu
colírio de prata nos
olhos. Nasceu pesando 3.180 kg e medindo 50 cm. Lindo, chorando forte,
muito saudável. Fiz o melhor para mim e para ele, não tenho dúvidas.
EU CONSEGUIIIIIIIIIIIII.
Juliana Duarte
Eu tive coragem de desafiar o obstetra, disse näo pra mais uma cesárea,
assinei o termo de responsabilidade, saí do hospital já em trabalho de
parto, e fui parir meu filho!!!
O trabalho Relato de VBAC: EU CONSEGUIIIIIIIIIIIII!! de Juliana Duarte foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-CompartilhaIgual 3.0 Não Adaptada.
Este texto possui uma licença Creative Commons BY-NC-SA 3.0. Você pode copiar e redistribuir este texto na rede. Porém, pedimos que o nome da autora e o link para o post original sejam informados claramente. Disseminar informação na internet também significa informar a seus leitores quem a produziu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário